– Há mulheres lindas – disse ela.
– Pois há, mas nunca conheci nenhuma tão bela como tu.
Margarida estava deitada nos braços dele e na penumbra do quarto era o castanho dos seus olhos que cintilava. Um feixe de luz branda acolhia e reconfortava o suor dos corpos em repouso no calor da cama. Sentia-se um perfume a jasmim que pairava no ar e um outro adocicado que emanava da pele dela.
– Gostava que me respondesses a uma questão – pediu ela no meio de um beijo terno.
– Diz meu amor.
– Porque te apaixonaste por mim?
Rafael sorriu e fitou-a intensamente.
– Porque vi em ti o que ainda não tinha visto em mais ninguém.
– O quê por exemplo?
– O que brilha por dentro da carne. A tua alma, a tua doçura. A ternura do teu olhar, a bondade que tens nas mãos quando ajudas sem olhar ao rosto, a delicadeza com que afirmas, muitas vezes, o teu ponto de vista… Enfim, um mar de coisas que demoraria o resto da noite a enumerar.
– Mas, e o corpo? Essa parte física que implica à partida a primeira opinião. O rosto perfeito, os lábios carnudos, os olhos azuis, as ancas sensuais, as pernas esbeltas e altas, o ventre liso… Como um protótipo de perfeição. Isso não te incomoda? É que eu não tenho nada disso. Sou baixa, com pernas tortas e rechonchudas, tenho bochechas e lábios finos, o rabo descaído e a barriga… Bom, a barriga sabes como é, tens aí a mão.
Ele calou-a com um beijo voraz.
– Margarida ouve com atenção: a sociedade de hoje é cheia de protótipos de perfeição, não só para os corpos, mas para tudo. Quando se ama alguém, como eu te amo a ti, ama-se no íntimo dos sentimentos. Os olhos de quem ama, normalmente não vêm o estado físico, leem a alma. Por isso, ainda há pouco te disse: há mulheres lindas mas eu ainda não vi nenhuma como tu. A tesão é uma coisa do corpo, o amor é coisa do coração, compreendes?
– Sim, eu compreendo e sei disso. Queria só saber se… bom, se me desejas?
Ele encarou-a e semicerrou o olho.
– Que pergunta mais disparatada é essa?
– Não é um disparate, é uma pergunta simples.
– Então, em vez de te responder deixa-me mostrar-te – afirmou num tom matreiro.
Riram-se os dois, antes de revolverem de novo os lençóis da cama e se entregarem às teias de um sentimento que vai muito além da carne.
Quando perdemos a capacidade de ver o melhor do outro, de o ler sem corpo, perdemos a visão do mundo.
Autora: Carla Pais